Ele andava pelas ruas solitário.
Olhava em volta e via pessoas, pessoas e mais pessoas, mas ainda assim se
sentia sozinho. Todos passavam apressados, em sua rotina diária, com
compromissos inadiáveis e insubstituíveis. Tinham que correr. Não tinham opção.
Se prenderam àquela vida e não conseguiam mais se livrar dela. Só se sentiam
úteis correndo, com maletas e celulares.
E ele andava só. Tinha
compromissos como todo mundo, mas tinha que ter um tempo só para ele. Um tempo
em que pudesse fazer as coisas que gosta, sem pressa, sem horários. Um tempo
para ser feliz. Para sentir no rosto o vento fresco de início de primavera,
para ver a maneira como os pássaros cantam como forma de atrair um companheiro,
e ver como os cachorros de rua se divertem com simples poças d’água e gravetos
secos. Em seu rosto formam-se sorrisos espontâneos, que nem mesmo ele sabe de
onde vem, acompanhados de uma sensação de paz e leveza. A maioria das pessoas
daquele grande centro robotizado não sabe o que é essa sensação. Não tem tempo
para isso. E isso deixa o pequeno solitário infeliz.
“Como pode eles abrirem mão
de algo tão simples? Tão essencial?”, ele se questionava. O sorriso. Você não
vê sorrisos espontâneos nas pessoas robotizadas. Vê sorrisos falsos, forçados
para agradar o chefe ou o cliente. No máximo sorrisos de alívio, no final da
tarde, após mais um dia de exaustivo trabalho, que vai ser sucedido por outros
tantos dias exaustivos de trabalho. Então, em uma praça, ele viu uma mulher.
Não era uma mulher comum. Era
uma mulher habitada. Que tinha alma e que não via o mundo como os robotizados,
mas que tinha a esperança de que eles, no fundo, fossem também habitados. E sua
missão era fazê-los rir. Ela se vestia de mímico. Em preto e branco, com
maquiagem de máscara grega e meiões listrados até a coxa. Tinha um vestido como
os de boneca, e luvas compridas com pequenos corações. Sapatos com pompons nas
pontas e um chapéu pequeno e engraçado. Ela chamava a atenção. E chamou a
atenção do pequeno solitário.
Ela fazia rir. Não pedia
dinheiro nem recompensa. Ela brincava com as flores, importunava o pipoqueiro,
e levava um balão à criança que havia derrubado o sorvete. Conversava com o
mendigo, elogiava a moça grávida, e batia palmas cada vez que o sol saia de
trás de uma nuvem e aquecia novamente aquela praça. E ela conseguia. Dos mais
distraídos e rabugentos, ela tirava um sorriso. E por mais que este fosse
rápido e com timidez, trazia para a moça a sensação de dever cumprido. Essa era
a sua missão.
E o pequeno solitário ficou
encantado. Viu nela, naquela pessoa sozinha, que agia maneira simples e sem
pedir nada em troca, alguém que fazia sua parte para deixar o mundo mais feliz.
E ele, também chamou a atenção da moça habitada. Não pela sua aparência, já que
não usava nada além de uma camiseta, um jeans rasgado e um all star surrado.
Ela viu nele aquela mesma luz que há pouco havia se iluminado nela por outros
olhos. Uma luz de esperança.
Ela viu que ele não era igual
às outras pessoas que ela tentava fazer rir. Que ele não era mais um robotizado
pela sociedade, e sim um também habitado. Ela não sabia o que a tinha feito
chegar a essa conclusão. Ela apenas sabia.
Então, agora foram dois
sorrisos. Dois sorrisos espontâneos, que ambos não sabiam de onde vinha, e que
trazia paz e leveza em dobro.
E ela estendeu as mãos. E foi como se algo o puxasse para
perto dela. E ele foi.
Hoje, a praça do centro já
não é mais a mesma. Ela anda mais iluminada. Nela, as pessoas passam, mesmo que
com pressa, só para sentir aquela sensação boa, que ninguém explica. E nela,
estão dois habitados. Fazendo rir, fazendo brincar, fazendo desligar a rotina
por alguns segundos, só para mostrar como a vida é legal, e que não deve ser
desperdiçada. São apenas dois, mas a diferença que eles fazem na vida daquele
monte de gente não pode ser contada.
Ótimo texto. Parabéns!
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