Quando
as pessoas falam “puxa, isso mudou a minha vida” referindo-se a algum
acontecimento, pessoa ou até mesmo algo material que por algum motivo
interferiu no seu pensamento, modo de agir etc, eu acredito. Sendo mais
sincera, acredito que muitos exageram no melodrama na hora de se apresentar
para alguém ou contar um fato de sua vida, mas acredito mais ainda, na cara
dura, que somos inevitavelmente maleáveis e suscetíveis a mudanças causadas por
situações da vida, mesmo que banais. Pois bem. Puxa, um texto mudou a minha
vida!
Diria mais que mudou a minha visão sobre a vida, mas, como tudo
acaba no mesmo lugar, sim, tive a vida mudada por um punhado de palavras e uma
ideia. A crônica “Pessoa habitada”, da gaúcha Martha Medeiros, apresentou a mim
um novo conceito sobre as pessoas. Na verdade, deu uma definição para aquelas
pessoinhas encantadoras que, apesar de serem poucas (na minha humilde opinião)
quando passam por nós fazem um arrastão emocional. Baseada na expressão
francesa “habité” e na mais abrasileirada impossível “esse aí tem gente em
casa”, Martha apresentou-me os “habitados”. Pessoas que têm dentro de si algo
especial, que é até difícil de explicar. Que têm angústias e dúvidas mas são
preenchidas também por curiosidade, vontade de agir, força e uma cabecinha
aberta que é de dar inveja.
Quando terminei de ler o texto, senti aquele “click”. É isso! É
exatamente a definição para as pessoas que tanto admiro, que me passam uma
serenidade, uma confiança e uma vontade danada de ficar conversando com ela horas
a fio. São aquelas pessoas que, ao meu ver, são bastante incompreendidas,
intituladas "avoadas" e julgadas por questionarem coisas que, para a multidão,
são perda de tempo. Mas que justamente por isso são especiais.
Passado algum tempo da minha iluminada descoberta, um professor
de literatura me apresentou os nefelibatas. O adjetivo foi usado por Lima
Barreto no livro “Os Bruzundangas” e significa, buscando a tradução do grego "nephele" (nuvem) e "batha", (em que se pode andar), aquele que
anda nas nuvens. Aquele que às vezes foge da realidade, mas que observa
atentamente a tudo o que está acontecendo. Pronto. Aí está o habitado em forma
de adjetivo grego. Fiquei fascinada novamente.
Aqueles que geram tanto julgamento mas também
tanta admiração para os olhos mais apurados e corações mais abertos não são
incógnitos na sociedade. Sei que ninguém tem o direito de classificar as
pessoas por julgamento próprio, mas às vezes é inevitável. Há pessoas que por
algum motivo não nos agradam, assim como há outras que sempre queremos ter por
perto. Não somos melhores ou piores por isso.
Tenho certeza de que há muita gente que me quer
longe, sem ter nada concreto contra mim, assim como tenho certeza de que há
pessoas que eu amo que me admiram como eu sou. É coisa de bater o santo. É
coisa de classificar sentimentos e atitudes que nos agradam e nos aproximar dos
afortunados portadores dessas características.
Tenho um olhar diferente para os habitados. Tenho
convívio com poucos, três ou quatro, mas quando percebo que alguém “tem gente
em casa” quero ficar próximo, porque sei que essa pessoa vai me transmitir
algum sentimento bom e algum aprendizado.
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